Ontem a noite, depois de um dia de feriado bem divertidinho, eu e R nos juntamos a Monsenhor Ariel e seu novo affair para ver um filme. Aqui em casa temos o luxo de montar um cineminha bem legal. Na porta (de vidro) que dá acesso a área colocamos um telao enorme, que cobre tudo. Usamos o datashow pra projetar o filme e conectar com o som - surround, espalhado pela cozinha e sala. O resultado é bem legal.
Já o filme de ontem foi Into the Wild (2007)...nao sei o nome em portugues. Baseado em fatos reais de um jovem que, ao terminar a faculdade, doa td seu dinheiro para uma instituiçao, muda de identidade e sai perambulando pelos EUA, com o objetivo de chegar ao Alaska. Vira andarilho por opçao, com o objetivo de negar o materialismo da sociedade. Na trama fica claro que, seu objetivo real era mesmo expiar seu passado, de dor e mágoas. E isso me fez pensar... afinal, a maneira como é filmado, te convida a isso. Muitas imagens com música e sem fala...espaços que permitem a divagaçao dos pensamentos.
Apesar de achar que o protagonista era meio troxa, me relacionei com ele em dois ponto específicos. O primeiro é que ele viajava sozinho. Numa certa altura chega a dizer que a felicidade da vida nao vem das relaçoes humanas, e sim dos lugares aonde nos sentimos verdadeiramente livres, na natureza. A segunda é que o grande motivo do seu "sumiço", como explicado acima, era a busca dessa expiaçao do próprio passado.
Eu já viajei muito sozinha, e confesso que gosto. Discordo do menino. Por experiencia própria sei que as relaçoes humanas oferecem um grau de prazer e felicidade incomparável ao prazer derivado de estar no topo de uma montanha. Na verdade nem sei se vale essa comparaçao. Sao coisas completamente distintas. Já dizia Allan de Bottom, no livro A Arte de Viajar, que estar em presença de certos lugares que a natureza oferece, lugares grandiosos - um deserto, montanha, bosque - pode provocar em nós uma sensaçao avassaladora. A grandeza de certas paisagens naturais tem o poder de nos lembrar o quanto somos pequenos, e sentir isso é incrível. Quase indescritível. Lembro muito bem de quando estive no lago Titikaka, no lado boliviano, em 2008. Foi exatamente o que eu senti. Eu acordo todos os dias e, ao olhar pela janela, me deparo com o cerro Plomo, um morro de quase 5 mil metros na cordilheira dos Andes. Apesar de estar acostumada a esta paisagem, ela ainda me provoca sensaçoes de admiraçao e respeito. De fato, a natureza nos oferece a chance de nos sentirmos pequenos e confrontar-nos com nossa própria pequenez existencial. Masa outra parte da equaçao de se sentir vivo deriva das relaçoes humanas. Aonde o ser humano se reconhece ou se desconhece. Porque já dizia a professora Sueli, da aula de Antropologia I, que nós nos conhecemos através dos outros.
O segundo ponto, o da viagem como expiaçao, me fez lembrar da minha viagem à Bolívia em 2008. Este foi o exato propósito de tal jornada. Expiar um coraçao quebrado. Toda a viagem foi devidamente relatada nesta blog, sendo este o último post do diário. Em 8 dias eu, Kell e Chu, cruzamos a Bolívia de ponta a ponta, encarando o tal Trem da Morte, Onibus que paravam a meia noite em acostamentos - para que as pessoas, incluso eu, pudessem fazer xixi - muita pobreza, muambas baratas, comidas na rua - que eu provei, apesar do medo - e outas muitas aventuras.
Longas horas na estrada, na companhia de uma dúzia de músicas do celular da Kell - porque eu descuidei e perdi o mp3! - os pensamentos deram muita volta. Voltaram ao passado, reviram cenários, buscaram respostas e soluçoes. Era como se eu buscasse a racionalizaçao de tudo para poder entender e aceitar. No dia passado no lago Titikaka, com a companhia da guia turística (exclusiva pra mim) e do tio que dirigia a lancha, foi a hora de sentir isso que eu falei nos parágrafos acima sobre o que a natureza provoca. Nunca vi água tao azul, contrastes de cor tao belos. Eu naveguei no lago mais alto de mundo, respirei um dos ares mais secos do mundo. E ali os demonios e fantamas do meu armário pareceram me dar uma folga. Já nao importavam mais. Secaram ou morreram sem ar, nao sei. Só sei que voltei a La Paz de alma lavada!
Óbvio que eu também sei que, ao voltar para Goiania, persisti no meu erro anterior. Em Goiania os demonios e os fantasmas voltaram a viver, como zumbis persistentes que se recusavam a morrer. Estavam bem enfraquecidos, sim, mas estavam ali, parasitando minha vida. Levou-se ainda alguns meses até que todos perdessem a batalha e eu reencontrasse meu verdadeiro eu, me redescobrisse. Nao foi fácil. Mas o sabor da vitória final foi tao delicioso que ainda o sinto!
Nesta semana próxima vou de volta a Bolivia. Primeira parada em La Paz, e depois para dois desertos - Salar de Uyuni e Atacama. Dessa vez viajo em paz, por puro prazer. Com uma companhia leve e gostosa. Confesso que receio nao achar tanta graça assim, hahaha...nao que eu queria expiar nada, mas...depois de tudo o que Bolibia 2008 representou, Bolivia 2010 será uma viagem totalmente distinta, e estou feliz por isso. Em 2008 eu buscava a cura...e sei que estar ali foi um primeiro passo. A companhia da época nao poderia ter sido melhor. Em 2010 eu busco a diversao, a leveza e nada mais. Dessa vez a natureza pode até me lembrar de quanto sou pequena.... mas a relaçao humana que me acompanhará - supostamente - será a responsável por lembrar-me que grande ou pequeno sao conceitos sempre relativos.
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P.S. Post escrito num sábado de manha....sem influencia de nenhuma droga, nem cafeína!
1 comentários:
Na natureza selvagem, nome traduzido do filme.
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